“A presença de Deus me é tão íntima, que me parece impossível perdê-la.
Esta presença dá à minha alma uma alegria que não posso explicar.”
(Santa Paulina)
A vocação da mulher é viver a alegria do Evangelho que se dá no encontro com o Cristo ressuscitado, mas viver essa alegria em tempos de exploração dos mais pobres em benefício de uma classe dominante é para nós um desafio, posto que esta situação gera opressão, sofrimento e tristeza para nós mulheres.
Algumas vezes para enfrentar essa realidade desumana corremos o risco de entrar numa apatia e desespero, mas por outras, animadas pela esperança, sonhamos em somar força com outras pessoas para buscar saídas. Dentre as diversas possibilidades de embate e superação dos momentos de sofrimentos, somos convidadas a nunca desanimar, mesmo frente aos ventos contrários, como dizia Santa Paulina. Na mesma linha, o Papa Francisco (p. 03, 2013), na sua missão de nos animar, fala da “Alegria do Evangelho que enche o coração e a vida inteira daqueles que se encontram com Jesus (…) do encontro com Jesus Cristo, renasce sem cessar a alegria”.¹
Posto isso, somos convidadas a refletir sobre a vocação da mulher: alegria do Evangelho. Para tanto, como guia, seguiremos o texto da Mulher Samaritana (Jo. 4,1-42). A escolha desse trecho evangélico revela que ninguém pode nos tirar a alegria de um encontro verdadeiro com Jesus. Encontro esse que nos invade de amor infinito, inabalável e permite-nos levantar a cabeça e recomeçar, com uma ternura que nos restitui a alegria de viver.
Para melhor compreensão, seguiremos o método de leitura proposto pelo CEBI do subsídio “Bíblia e Educação Popular: encontros de solidariedade e diálogo”.² O texto apresenta o encontro de Jesus com a Samaritana e a alegria dela após esse encontro, ao tornar-se missionária da Boa Notícia.
Primeiro momento – Aproximação e encontro
A cena do Evangelho nos apresenta alguns temas, dentre os quais uma discussão teológica, na qual ambos consideram os elementos que constituem as necessidades do cotidiano: pão, fome, água, sede, carência, relação. Essa memória com as preocupações e ações. Sugere uma ação missionária que avance os limites geográficos impostos pela aquela cultura. E, como proposta comunitária, o protagonismo das mulheres. Outro tema abordado é a construção social dos gêneros masculino e feminino. Lendo o texto vamos percebendo que é um encontro, no qual a conversa se movimenta, a partir de elementos que constituem necessidades do cotidiano.
Segundo momento – Encontros e diálogos que rompem fronteiras
O encontro acontece na terra da mulher, na Samaria. É Jesus quem sai de sua terra, seus limites, seu chão e atravessa a terra estrangeira. Este é um encontro que expande os limites impostos pelas concepções teológicas que delimitam e excluem pessoas. Os encontros são possibilidades de construir e/ou ressignificar relações fragilizadas ou destruídas por preconceitos que fazem as pessoas sofrerem. Este encontro entre Jesus e a Mulher Samaritana gerou novas relações e possibilidades para aquela mulher, agora era capaz de falar da experiência do encontro com Jesus, então se tornou uma discípula. O encontro trouxe a alegria para a sua vida de mulher discriminada, ela passa a ser discípula do mestre. Que a graça do encontro com Jesus nos impulsione a testemunhar, transmitir e anunciar o Evangelho, assumindo a tarefa ministerial na Igreja e missionária no mundo.
Terceiro momento – Encontro e diálogos sobre a vida e o cotidiano
Nós, mulheres, a partir do nosso encontro com o Cristo, somos convidadas a promover encontros motivados pelo desejo, pela fome de satisfazer nossa vida por inteiro e com dignidade. Isso porque entendemos que os elementos do cotidiano tais como: comida e água se misturam no nosso diálogo cotidiano-teológico. Jesus sente sede real, mas, no diálogo com a mulher, Ele fala da água usando uma linguagem metafórica, enquanto a mulher fala da água a partir de sua experiência prática de suas preocupações diárias concretas. Outro tema do cotidiano é o matrimônio que vem em cena porque há ali uma relação de proximidade e confiança entre os dois, que dá para falar da vida pessoal e familiar. Durante essa conversa, a mulher se transforma e experimenta a alegria de não ser julgada pela sua condição social, ali se estabelece um encontro-diálogo. E ela faz a sua profissão de fé reconhecendo Jesus como profeta e como Messias.
Quarto momento – Encontros e desencontros
As aproximações são constituídas de encontros, desencontros e situações conflituosas. No início do texto, há um desencontro entre Jesus e a mulher, mas ambos continuam a conversar e aos poucos o que era conflituoso se harmoniza e ambos experimentam a alegria do encontro verdadeiro, mas há também o desencontro entre Jesus e os discípulos. Contudo, os desencontros são necessários para haver a alegria do encontro, que nos torna discípulas do Mestre.
Quinto momento – Gerar novos encontros
Esse texto mostra como um encontro pode possibilitar outros encontros. Do encontro com Jesus, a mulher deixa o cântaro de lado e vai à cidade para falar da alegria de sua experiência para a sua gente, seus conterrâneos: “Vinde e vede”. Jesus também fala para os seus discípulos.
Foi graças ao encontro com Jesus, que a mulher estabeleceu um diálogo de intimidade e confiança, no qual foi resgatada na sua consciência isolada e se converteu numa seguidora de Jesus e anunciadora da grande alegria.
Também nós somos chamadas a fazer esse encontro com o Cristo. Encontro que nos permita viver a alegria da plenitude humana. E, assim, permitiremos que “Deus nos conduza para além de nós mesmos a fim de alcançarmos o nosso ser mais verdadeiro” Francisco (p. 09, 2013).
Referências:
1 – Exortação Apostólica Evangelii Gaudium do Santo Padre Francisco ao episcopado, ao clero, às pessoas consagradas e aos fiéis leigos sobre o anúncio do evangelho no mundo atual do Papa Francisco.
2 – Fonte: Bíblia e Educação Popular: encontros de solidariedade e diálogo. Elaine Neuenfeldt é assessora e ex-diretora nacional CEBI. É pastora da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil – IECLB e atualmente contribui na Federação Luterana Mundial, em Genebra.
Colaboração: Irmã Márcia do Amaral Miranda